BRASIL EM BUSCA DO URSO DE OURO
     
 

PUBLICADA EM 11.02.14

Carlos Augusto Brandão

Praia do Futuro, de Karim Ainouz, teve sua estreia numa sessão para a imprensa aqui na Berlinale, onde concorre na competitiva oficial do festival.

Agora está na mão dos jurados, foram dados  os primeiros passos em busca do prêmio máximo da Berlinale. 
 
 
Desde Tropa de Elite, em 2008, um filme dirigido por brasileiro não participava do seleto tapete vermelho.
 
O filme conta a história de Donato (Wagner Moura), um experiente salva-vidas na Praia do Futuro, em Fortaleza. Ao fracassar pela primeira vez em um resgate, acaba conhecendo o alemão Konrad (Clemens Schick) amigo da vítima. Motivado pelas circunstâncias, Donato resolve recomeçar sua vida em Berlim, deixando para trás a família.  Anos mais tarde, Ayrton (Jesuíta Barbosa), o irmão mais novo, embarca para a Europa em busca daquele que considerava o seu herói. Grande parte das sequências, cerca de 70%, foi rodada em Berlim e Hamburgo.
 
Praia do Futuro é o quinto longa-metragem de Aïnouz, de 48 anos.  Com uma obra múltipla que transita entre as artes plásticas e o cinema, o diretor estreou em longa-metragem com o aclamado Madame Satã e, desde então, dirigiu O Céu de Suely (2006); Viajo Porque Preciso, Volto Porque te Amo (2009, co dirigido com Marcelo Gomes); e Abismo Prateado (2011).
 
O filme foi desenvolvido em parceria com a produtora paulista Coração da Selva, que depois de angariar o apoio de importantes investidores do mercado de cinema brasileiro, atraiu o interesse de um grupo de produtores e financiadores alemães, firmando a primeira coprodução oficial entre os dois países. Praia do Futuro está previsto para estrear nos cinemas brasileiros em 1º de maio.
 
Karim está na cidade acompanhado da equipe do filme. Ele mora aqui desde 2009 e, a cada dois meses vai ao Brasil, onde ministra um laboratório de roteiros, criado pelo Instituto Dragão do Mar,  em Fortaleza.
 
Ele começou a trabalhar no roteiro, escrito em parceria com Felipe Bragança, logo após o término da série de TV Alice, (2008), desenvolvida para a HBO.
 
O elenco tem um ótimo desempenho não só Moura como o corajoso personagem, mas também Barbosa (melhor ator no Festival do Rio por Tatuagem) e Schick (ator alemão de teatro e cinema).
 
Após a projeção, acompanhado dos três atores, Karim chegou sob aplausos para a coletiva com a imprensa.  As perguntas giraram em torno da origem do filme, do elenco e da comparação de Praia do Futuro com outros filmes do diretor.
 
Karim disse que uma das coisas importantes no filme e que bate muito com que ele pensa, é a questão do ser humano.
 
“Eu gosto de gente e costumo mostrar isso em meus filmes”, ressaltou.
 
Ao falar sobre sua preparação para interpretar Donato, Moura disse que foi uma loucura.
 
 “Sendo baiano, eu precisava expressar no filme a forte cultura do cearense”, resumiu  o ator.
 
Desde sábado, todos os ingressos para o público aqui na Berlinale estão  esgotados. Além da estreia, estão previstas mais quatro sessões do filme.
 
 
ENTREVISTA
 
Aïnouz conversou com o Mccinema  sobre esta seleção em Berlim, sobre o filme e sua expectativa com os resultados que terá aqui.
 
 
Qual é o cerne de Praia do Futuro?
 
“É uma história sobre coragem, risco, viagem, aventura e liberdade. São personagens que não têm medo de largar tudo para começar a vida de novo. São destemidos, velozes, querem pegar para si tudo o que o mundo tem a oferecer”.
 
Por isso ele foi filmado fora do Brasil?
 
“Ele precisaria ter sido feito fora do Brasil. O personagem vai embora para outro lugar e começa nova vida. Além disso, foi uma decisão boa, é a primeira coprodução oficial entre Brasil e Alemanha, um cinema virado para o mundo”.
 
Há alguma inspiração autobiográfica na história?
 
“Meus pais se separaram quando eu era pequeno. Descobri que tinha uma meia-irmã quando ela já estava com 20 anos. Então, fui criado como filho único. Acho que Praia do Futuro partiu desse desejo de tentar imaginar como tudo teria sido diferente se eu tivesse um irmão”.
 
O filme, voltado para o universo masculino, muda o tom de seu trabalho ancorado até então em dramas intimistas femininos?
 
“Meu cinema se faz mais de personagens do que de dramas e queria abordar um aspecto importante da minha geração na faixa dos 40 anos. A gente vive com muitos medos, de envelhecer, de ficar sozinho, de perder o emprego e por aí vai. Eu quis fazer um filme sobre o medo e seu reverso, a coragem”. 
 
Além de falar sobre homens e irmãos, há também um mote ligado a  super-heróis?
 
“No filme, Jesuíta se cria achando que o irmão salva-vidas é um herói. Há um mito da força, da virilidade, mas eu queria justamente mostrar o momento em que o super-herói se fragiliza. É um filme de homens, mas é delicado, não é coisa de valentões”.
 
Você já teve outras oportunidades de estar na Berlinale?
 
“Muitos anos atrás, meu primeiro curta-metragem foi selecionado para Roterdã e Berlim e eu terminei confirmando o primeiro. Com isso, perdi a chance de estar na Berlinale, mas desenvolvi uma relação muito forte com a cidade e o próprio festival.  Wielland Speck (do Panorama) virou um amigo e tem acompanhado meu trabalho”.
 
 
O  que representa essa indicação agora?
 
É uma alegria imensa representar o Brasil na Berlinale, uma das mais importantes vitrines do cinema mundial.  Além de ser a coroação de um projeto no qual venho trabalhando há muito tempo, o festival dá uma visibilidade muito grande ao filme.  É uma espécie de selo de qualidade. O fato de o filme estrear em Berlim, onde parte da história se passa, também é muito bacana.  O longa é, de certa forma, um presente para uma cidade que me enche de inspiração.  Fico honrado também por estar ao lado de cineastas tão talentosos que admiro, como o Alain Resnais, por exemplo.
 
 
Qual sua expectativa para ganhar o Urso? 
 
“Em festivais como este podemos aprender muito. Somente estar competindo aqui  já é muito importante.  Basicamente eu tentarei aproveitar, ver bons filmes e procurar falar com outros diretores”.
 
A locação em Berlim pode ajudar na receptividade?
 
O fato de o filme ser uma coprodução com a Alemanha não influenciou diretamente na decisão dos selecionadores da competição, mas não podemos negar que seja o ambiente mais potente para o filme dentre os três festivais internacionais mais importantes do mundo. Ele foi rodado em Berlim e é como se estivesse sendo dado de volta para a cidade. O filme tem um desenho de produção singular, é um retrato (econômico e cultural) do nosso tempo, uma produção brasileira com padrão internacional.
 

     
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