O OLHAR DE FERRARA PARA PASOLINI
     
 

PUBLICADA EM 22.09.14

Myrna Silveira Brandão

Pasolini, de Abel Ferrara, mostrado ontem numa prévia para a imprensa do Festival de Nova York, dividiu a plateia.

O filme foi recebido com um misto de decepção e surpresa.
 
A reação desfavorável  talvez esteja no fato do filme não revelar nada de novo ou polêmico sobre o controverso cineasta. Ou também pelo viés poético dado ao personagem, principalmente vindo de um diretor conhecido por obras fortes como Vício Frenético (1992) ou o recente Bem-vindo à Nova York,  já lançado no Brasil.
 
O filme recria as últimas 24 horas da vida do cineasta, poeta e escritor italiano quando ele conversa com seus amados familiares e amigos, escreve, dá uma entrevista brutalmente honesta, divide uma refeição com o amigo Ninetto Davoli (Riccardo Scamarcio) e vai ao encontro da tragédia  no seu Alfa Romeo cinza.
 
A narrativa alterna esses eventos com cenas e personagens tirados de projetos que Pasolini desenvolvia como o novo capítulo do romance “Petrolio” e o roteiro de Porno-Teo-Kolossal.
 
Ferrara  diz que procurou traçar um retrato de tudo aquilo que Pasolini representava.
 
“Meu objetivo foi oferecer uma visão sobre sua vida,  obra e paixões. Ele era um homossexual que combatia o poder, vivia em constante vigilância e, mesmo assim, conseguia se reinventar constantemente.  O filme tem como ponto de partida esse respeito por ele”, ressalta.
 
Willem Dafoe tem um excelente desempenho no papel título.  É também  significativa a presença de Ninetto Davoli, amigo e ator em 11 filmes de Pasolini. A participação dele se dá na melhor sequência do filme, quando interpreta Epifanio no longa Porno-Teo-Kolossal, que Pasolini nunca realizou. 
 
Ninetto discorda daqueles que falam  do espírito de autodestruição de Pasolini.
 
“Ele amava a vida.  Denunciou quando fomos capturados por um sistema consumista que destrói o ser humano e por isso lutava contra, com todas as suas armas.  Incomodava muita gente”, lembra Ninetto, destacando que ele enfrentou mais de 30 processos ao longo da vida.
 
“Ele não se importava, não se deprimia, nada podia detê-lo. Era uma força da natureza”, ressalta. 
 
O filme expressa a personalidade de Pasolini, até mesmo em seu desfecho trágico, que não foi surpreendente. 
 
Ferrara descreve bem numa frase a tumultuada vida e morte de Pasolini.
 
“A morte de cada um reflete a sua própria vida”, diz Ferrara sobre o talento autor de obras como Teorema (1968) e Os Contos de Canterbury, cujo trágico desaparecimento ainda não foi totalmente explicado.
 
Trinta e oito anos depois de ter sido assassinado, as circunstâncias da sua morte são até hoje envolvidas em dúvidas e mistério.
 
Sempre reverenciando o controverso artista italiano, o NYFF, em sua edição de 2009, exibiu La Rabbia di Pasolini, de Giuseppe Bertoluci, nova versão  de La Rabbia, que Pasolini havia realizado em 1963, um forte documentário que  refletia a visão pessoal do diretor sobre política, religião, a guerra e outros assuntos relacionados com o mundo da época.

     
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