CARTAS DA GUERRA
     
 

PUBLICADA EM 15.02.16

Carlos Augusto Brandão

Numa concorridíssima sessão, “Cartas da Guerra”, de Ivo M. Ferreira, marcou a representação portuguesa ontem na 66ª edição do Festival de Berlim.

O filme é a adaptação para o cinema do livro “D’este viver aqui neste papel descripto: Cartas da Guerra”, que reúne as cartas escritas pelo famoso autor português António Lobo Antunes, à sua mulher Maria José, a partir de um cenário de guerra colonial vivido em Angola entre 1971 e 1973. Na época, ele era um jovem alferes e médico de 28 anos.
 
O elenco incluiu atores portugueses e angolanos. O escritor é vivido pelo ator Miguel Nunes e sua mulher é interpretada por Margarida Vila-Nova, esposa do diretor.
 
Pereira conversou com o Mccinema sobre a origem do filme, os aspectos políticos, as dificuldades nas filmagens e o tom narrativo que imprimiu à história. 
 
 
Sobre as dificuldades para fazer o filme
 
 “Foi um trabalho duríssimo, Este é um projeto pesado, caro. Interrompemos nossa vida em Macau para ir a Lisboa fazer o filme. Filmamos durante quatro semanas no Cuando-Cubango (zona inóspita conhecida como as terras do fim-do-mundo) e em Malange. Foi muito duro, houve elementos da equipe que adoeceram. Os atores tiveram de andar dentro de rios com crocodilos, foi bem difícil”.
 
Sobre a escolha do elenco
 
“É um elenco muito jovem, pessoas entre 18 e 20 e poucos anos, salvo algumas exceções, como é o caso de Lobo Antunes, que já tinha 28 anos, já havia se licenciado em medicina em 1969 e casado em agosto de 1970, mesmo antes de partir para a guerra, em 06 de janeiro de 1971. Na grande maioria é gente muito nova.  Isso foi muito importante para mim, porque há questões aos 20 anos que aos 30 são completamente diferentes, em termos de dilemas pessoais”. 
 
Sobre a construção do cenário
 
“O décor principal que é o aquartelamento de Chiúme, foi construído da raiz. Para tal foi necessário reconstruir uma ponte dinamitada e destruída na guerra para dar passagem aos caminhões com os materiais de construção do quartel. Isto não tem nada que ver com processos Hollywoodianos, mas não deixa de ser absolutamente incrível. Ali não há água nem luz, há uma povoação, um riozinho que passa, mas nós precisávamos de infraestruturas. Houve ali pequenos milagres e muito, muito trabalho. Mas foi vital e fulcral o apoio da população local e do Governo provincial de Cuando-Cubango”.
 
 
Sobre a repercussão que o projeto pode ter
 
“É um projeto cheio de singularidades e delicadezas. É adaptação de uma obra que constitui o passado biográfico de quem não só ainda pertence ao mundo dos vivos como se agigantou na esfera pública. O filme tem como ponto de partida questões muito sensíveis e delicadas. São documentos muito íntimos, cartas de amor, a intimidade de um casal. É um trabalho de um escritor antes de ser escritor. São cartas escritas por alguém que na época era um jovem, que estava pensando em escrever o seu primeiro livro, mas que  hoje é um dos escritores portugueses mais lidos, traduzido e premiado”. 
 
 
Sobre os cuidados que foram tomados
 
“Sei que estava a pegar uma história de pessoas que eu conhecia e que falava das suas vidas, da história de amor entre duas pessoas.  Só ia querer fazer o filme se houvesse da parte de Maria José Lobo Antunes e Joana Lobo Antunes (filhas do casal), desejo nesse projeto, mas simultaneamente que me deixassem livre.  Tive uma primeira conversa com elas, desenhei o filme e a partir daí fui trabalhar no argumento.  E ver até que ponto continuava o interesse delas.  Sempre estive consciente do imenso compromisso e da enorme responsabilidade de não trair a confiança que me foi depositada”.
 

     
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