SEBASTIÁN LÉLIO VOLTA AO SEU TEMA RECORRENTE
     
 

PUBLICADA EM 12.02.17

Myrna Silveira Brandão

Com sua cinematografia cada vez mais constante nos festivais mundiais, o Chile marcou presença ontem na 67ª edição do Festival de Berlim.

“Una Mujer Fantástica”,  de Sebastian Lélio, que concorre ao Urso de Ouro, era aguardado com expectativa e foi muito bem recebido numa lotada sessão para a imprensa.
 
Lélio está de volta ao festival, onde obteve muito sucesso em 2013 com   “Glória”,  que saiu daqui com vários prêmios: da Confederação das Artes, o Ecumênico e ainda com o Urso de Prata de melhor atriz para Paulina García, que vive a personagem título. 
 
Seu novo filme é protagonizado por Daniela Vega como Marina, uma transexual que enfrenta o drama da morte do seu noivo, Orlando (Francisco Reyes).  Além disso, ela tem que suportar  o repúdio da família de Orlando.  Ninguém a quer por perto, mas Marina não tem  intenções de sair de cena. Toda a trama transcorre em quatro dias e também atuam  no filme Aline Kuppenheim, Luis Gnecco e Amparo Noguera.
 
Em entrevista ao Mccinema, Lélio falou sobre seus personagens prediletos – as mulheres fortes – sempre presentes em seus filmes.
 
“Acho que o cinema nasceu para filmar as mulheres e talvez seja essa a explicação porque me conecto tanto com elas na hora de contar histórias.  Quando fiz “Gloria”, tive a possibilidade de sintonizar com algo que estava no ar, esse conceito de  “o que é ser mulher?”.  “Una Mujer Fantástica” também é um filme sobre a mulher, mas vai muito mais além do que “Gloria”.
 
O que significa exatamente ir muito mais além?
 
“Tem relação direta com as questões que eu quis propor para o público.  O amor de Marina era legítimo?  Ela estava com Orlando porque o amava ou porque queria alguma outra coisa? Ela estava em seu pleno juízo?”, enfim espero que a trama do filme provoque reflexões nos espectadores, inclusive porque estão, a meu ver, muito próximas do seu cotidiano e de muita coisa que está acontecendo no Chile”.
 
Por que a decisão de que a protagonista fosse de fato transexual, como é o caso de Daniela Vega?
 
“Se não fosse dessa forma,  não sei se teria  feito o filme.  O fato de ser  uma mulher trans faz com que nos esqueçamos de qualquer teoria sobre o assunto.  Daniela não é uma atriz representando algo, simplesmente ela é.  Por trás de toda a narrativa sofisticada que é o filme, há alguém real que cria uma tensão muito especial no contexto da história”. 
 
E Orlando, como definiria o personagem de Francisco Reyes?
 
“Ele é um homem mais acomodado do que Marina e tem clara a condição sexual dela. Isso também o torna um pária entre os seus.  E, por sua vez, isso também os transforma em  um par raro, desencaixado, fora de esquadro, algo assim como dois novos Bonnie and Clyde (clássico de Arthur Penn, de 1967). 
 
 
Qual a inspiração para o título do filme?
 
“O título tem duas conotações: inicialmente uma referência a uma mulher genial, determinada, espetacular. Ao mesmo tempo, pode ser uma mulher fantasiosa ou ser produto de uma fantasia. É outra questão que deixo para os espectadores”.
 
A abordagem do próximo projeto também focará nas mulheres?
 
“Sim, é uma adaptação do livro Disobedience,  de Naomi Alderman e há personagens femininos fortes. Um deles será interpretado por Rachel Weisz.  Na trama, ela retorna ao lugar em que nasceu, em Londres, apesar de que ninguém a querer ali”.
 
O sucesso que os  filmes chilenos vem fazendo tem a ver com os novos tempos vividos pela sociedade chilena?
 
“Acho que sim, penso que é produto do momento histórico e social que vive o Chile desde a recuperação da democracia em 1990. Vivemos um processo de aprendizagem, de reparação, de fazer escola, filmando muito e num momento de expansão dos limites possíveis”.  
 
Pretende continuar morando em Berlim?
 
“Estou residindo aqui desde 2013, quando “Glória” esteve na seleção oficial do festival. Vivo em Berlim, mas penso todo dia no Chile. Berlim é uma cidade poderosa e a distância tem um lado que me permite  mirar  a realidade chilena de outra forma”.
 
Qual resultado espera para Una Mujer Fantástica aqui na Berlinale?
 
“Acho que o filme é luminoso, atraente, não é triste ou amargo. Espero que os espectadores que têm uma boa recordação de “Gloria” também se conectem com “Una Mujer Fantástica”  e vivam mais uma experiência cinematográfica neste grande festival, que tenho a honra de participar novamente”.
 

     
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