Festivais - SOFRIMENTO E ESPERANLÇA
     
 

PUBLICADA EM 23.09.14

Myrna Silveira Brandão

Deux Jours, Une Nuit, novo filme dos diretores belgas Jean-Pierre e Luc Dardenne emocionou ontem o NYFF.


 
O filme, que concorreu à Palma no Festival de Cannes não teve grande repercussão por lá, mas os admiradores dos irmãos cineastas não se impressionaram muito com o fato e lotaram o auditório do Lincoln Center,  na concorrida sessão para a imprensa ontem à tarde, que teve a presença dos Dardennes.
 
Na verdade, a dupla já tem  um lugar assegurado aqui no NYFF, onde esteve em 2002 com O Filho e em 2005 com A Criança.
 
Deux Jours, Une Nuit  mantém a assinatura e a homogeneidade do trabalho eticamente engajado dos Dardennes, na linha da temática político/social que realizam, desde o perturbador La Promesse, de 1996, sobre o trabalho semiescravo de imigrantes ilegais na Bélgica. 
 
Rosetta – que lhes deu a primeira Palma em 1999 –  não ficava atrás ao tratar da desumanidade e da indignidade do desemprego, seguida de O Filho, na abordagem de um drama pessoal, tendo como pano de fundo a classe operária dos artesãos. A segunda Palma veio com A Criança (2005)  mais um a  retratar mazelas sociais daqueles que vivem à margem da sociedade.
 
Deux Jours, Une Nuit,  acompanha uma mulher depressiva (Marion Cotillard), durante um fim de semana com uma difícil missão: convencer seus colegas trabalhadores a não apoiar sua demissão, que lhes renderá um bônus de 1.000 euros.
 
Ela precisa de nove votos para manter o emprego, mas enfrenta não apenas as reações contrárias de alguns companheiros (uma quer o dinheiro para melhorar o jardim, outro precisa pagar a faculdade da filha), como a depressão clínica.
 
O filme, assim como todas as obras dos Dardennes, através de uma história particular, investiga  a dura realidade da Bélgica e, neste caso, também  o esforço da classe média trabalhadora.
 
Os cineastas falam sobre o filme, o trabalho conjunto que desenvolvem e revelam que contar essa história era um projeto antigo da dupla. 
 
Sobre a ideia de realizar Deux Jours, Une Nuit
 
“Nós tínhamos essa história na cabeça já há um longo tempo. Sempre tivemos vontade de falar sobre a solidariedade e mostrar que ela ainda é possível hoje em dia. E é sobre isso que o filme trata.  E ele está sendo lançado  no momento certo porque o desemprego ronda a Europa”.
 
Sobre evitar que o filme apelasse para o sentimentalismo
     
“Era uma cilada fácil, mas realmente conseguimos que isso não acontecesse. Também não queríamos explanações psicológicas e nem o passado explicando o presente. O importante para nós é que os espectadores simplesmente reflitam sobre as ações e o relacionamento entre os personagens”. 
    
Sobre Marion Cottilard  ter sido primeira opção para o papel
 
“Sabíamos desde o início que esse filme seria diferente.  Esse foi um fator importante para termos no elenco uma atriz do porte de Marion,  ao invés de outra pouco conhecida. Nós a conhecemos nas filmagens de Ferrugem e Osso (2012) que produzimos. Desde que a vimos com o filho nos braços, decidimos que seria a protagonista do nosso filme. Fabrízio Gongione, o excelente ator que interpreta o  marido que a apoia também foi nossa primeira escolha”.
 
Sobre a importância de falar sobre solidariedade
 
“Muitos tem dito  que o filme é uma história de persistência e superação e nós concordamos com isso. Toda a construção dramática gira em torno da luta de Sandra para salvar seu emprego. Mas é também uma ode sobre a importância da solidariedade que, embora ainda exista, está cada vez mais difícil de ser encontrada”.
 
Sobre a definição para o filme
 
“Além da esperança, é uma história sobre responsabilidade,  amadurecimento, redenção. Contamos histórias simples sobre pessoas simples. Nosso cinema procura mostrar os pequenos dramas que acontecem no lugar onde vivemos e que na verdade são universais, mas desta vez queríamos encontrar uma fluidez maior, desde que não retratasse uma bondade de clichê e que ficássemos o mais próximo possível do sentimento humanista”.
 
Sobre o trabalho que desenvolvem juntos
 
“Nossos filmes têm um olhar crítico sobre a sociedade atual, a vida social de hoje, a crise das relações entre as pessoas e a família, enfim, sobre as perguntas e reflexões que fazemos sobre tudo isso. Somos irmãos e as histórias de família nos interessam muito. Talvez por isso, nosso trabalho seja muito participativo, se um de nós sugere uma forma diferente de filmar, o outro jamais se nega a tentar”.