Festivais - A ARTE COMO INSPIRAÇÃO
     
 

PUBLICADA EM 09.10.16

Myrna Silveira Brandão

Os filmes do diretor Eugène Green tem um viés bastante diferenciado.

Eles são como divagações sobre as relações entre a arte, principalmente a arquitetura, a cultura, o conhecimento e a figura humana, bem como uma meditação sobre o transcurso da vida e suas implicações nas relações sentimentais.
 
Assim é “La Sapienza”, que encantou os espectadores em  2014, cujas sequências narrativas mostram o contraste do planejamento urbano com a liberdade da natureza e o design estético orientado para um viés humanístico. 
 
Assim também é “O Filho de José”, seu novo filme, muito aplaudido ontem na 18ª edição do Festival do Rio e no qual a arte é novamente um personagem. A pintura e a arquitetura são uma clara fonte de toda a estética do longa-metragem.  
 
Através da adaptação de  algumas passagens da Bíblia e no seu estilo satírico, o diretor  constrói uma história intrigante e inovadora.
 
O filme segue Vincent de 15 anos que vive com a mãe, Maria, que sempre lhe disse que ele não tem pai.  Mas ele nunca acreditou nessa afirmação e, ao iniciar uma investigação por sua conta, descobre que seu pai é Oscar Pormenor.
 
O jovem sai em sua busca, mas infelizmente constata que se trata de um homem egoísta e prepotente.  Revoltado Vincent toma inspiração na história de Abraão e Isaac para se vingar do pai.
 
Mas a trama toma outro rumo quando ele esbarra com Joseph, o irmão de Oscar.  Os dois iniciam uma amizade e Vincent  apresenta seu o amigo à sua mãe.
 
A música e a literatura também estão presentes no filme na medida certa.  Um grande talento do diretor é conseguir transmitir à sua audiência o elemento sublime que ele encontra em objetos artísticos, algo que poucos realizadores conseguem fazer.
 
Ao invés de simplesmente falar seus diálogos, os atores declamam como se fossem parte de uma estilizada e formalizada construção do teatro barroco, interpretando seus papéis tranquilamente, num tom declamatório.  Os planos são bem estudados e os cenários encaixam perfeitamente no todo.
 
O filme é um veículo de apresentação de uma história humana estranhamente comovente, resultando numa obra de simbiose cômica que tem como seu ponto alto a simplicidade.
 
A religião, por sua vez, serve de base para o roteiro, mas sem excessos, traduzindo-se num humor inteligente, com referências bem construídas, personagens interessantes e momentos verdadeiramente hilariantes. Além da cor que confere um visual deslumbrante ao filme.
 
O jovem Victor Ezenfis, que vive Vincent tem um excelente desempenho.  Ao seu lado, Mathieu Amalric reinventa-se como o poderoso Oscar em mais um exemplo da versatilidade do ator.  A atriz portuguesa Maria de Medeiros surge numa pequena e singular interpretação de uma excêntrica crítica literária.
 
“O Filho de José” – que teve seu lançamento na prestigiada Mostra Fórum do último Festival de Berlim – é um filme inteligente, divertido e cativante.