Festivais - SENEGAL SE APRESENTA NA BERLINALE
     
 

PUBLICADA EM 11.02.17

Myrna Silveira Brandão

“Félicité”, produção conjunta da França, Senegal e Bélgica, é dirigida pelo senegalês Alain Gomis.

O cineasta está de volta à mostra competitiva do Festival de Berlim, onde concorreu em 2012 com “Tey”  (“Hoje”).
 
A sessão prévia para a imprensa do seu novo filme – que está sendo mostrado em première mundial – aconteceu ontem, seguida de uma coletiva com o diretor.
 
O filme é a história de Félicité, mãe solteira e cantora de um grupo folclórico em Kinshasa (Congo), que mora com Samo, seu filho de 16 anos. A protagonista é vivida pela atriz congolesa Véro Tshanda Beya e o elenco conta ainda com Gaetan Claudia e Papi Mpaka,
 
Uma manhã ela recebe uma comunicação do hospital que Samo teve um acidente e corre o risco de perder a perna, a menos que ela tenha o dinheiro para pagar uma cirurgia.
 
Ela parte, então  numa busca desesperada em toda a cidade para levantar a quantia necessária,  mas quando consegue o recurso , é tarde demais: ele teve a perna amputada e o mundo de Félicité entra em colapso.
 
As locações foram realizadas em Kinshasa e no Senegal e a música é uma mistura de canções modernas e outras profundamente enraizadas na tradição africana.
 
Esse, por sinal, é um dos motes do filme mesclando tradição e modernidade, uma fórmula popular entre os cineastas africanos e que reflete suas lutas internas e externas.
 
 Gomis iniciou a entrevista detalhando  como concebeu seu filme.
 
“A ideia inicial era fazer um filme sobre uma cantora de uma banda chamada Kasai All Stars.  Mas só comecei  a trabalhar no roteiro um ano depois. Normalmente, preciso de um tempo para estabelecer ligações entre as ideias e um roteiro completo que faça sentido. Acho importante fazer com que os espectadores sintam o personagem, sintam o momento, enfim, sintam o filme”, explicou o diretor acrescentando que, para conduzir a narrativa,  confia mais na estética e nos sentidos do que nos diálogos.
 
“Eu não acho que os filmes estão na tela e sim na cabeça dos espectadores.  Cineastas  como Eisenstein (Sergei) e Hitchcock (Alfred) disseram isso um milhão de vezes. É importante dar os elementos necessários para os espectadores serem capazes de construir o quadro completo”, ensinou Gomis,  que estabelece com seu filme uma ligação com o atual momento político e sócio econômico do Senegal, da África Ocidental e da Europa.  
 
“É importante colocar essas questões no filme porque a luta política é parte de nossas vidas como seres humanos. Cada geração tem que ter sua própria luta para um mundo mais justo e  melhor”, ressaltou.
 
Sobre as influências de outros diretores em seus filmes, Gomis diz que são muitas.
 
“Minha primeira influência foram os filmes de Sergei Eisenstein, Friedrich Murnau e Djibril Diop Mambety (lendário diretor africano, autor de “Bouki Touki”, morto aos 53 anos).  E também Andrei Tarkovsky,  especialmente  a forma como ele cria realidade e sonho.  E ainda Abderrahmane Sissako, Asghar Farhadi, Lars von Trier, Apichatpong Weerasethakul, que é um dos melhores e mais interessantes cineastas no momento. E também amo o  que  Mahamat-Saleh Haroun está fazendo”, enumera o diretor enfatizando que teria muitos outros para citar e faz uma ressalva.
 
“Ver através dos olhos dos outros cineastas, é uma das coisas mais importantes para fazer um filme, mas é necessário libertar-se de suas influências e encontrar seu próprio caminho, é a parte mais desafiadora de filmar”, destaca concluindo:
 
“Esses cineastas que citei foram importantes, mas eu amo todo tipo de cinema. O difícil desta área é lutar contra a grande indústria”, desabafa o diretor de 44 anos, que foi criado e está radicado na França.