Festivais - O VINHO COMO PERSONAGEM
     
 

PUBLICADA EM 01.02.14

Carlos Augusto Brandão

Natural Resistance, de Jonathan Nossiter é destaque em duas mostras na 64ª edição do Festival de Berlim: Panorama Documenta e Cinema & Culinária.

O filme é um documentário sobre os fabricantes de vinhos italianos e conecta cenas em viniculturas com imagens de arquivo da Cineteca de Bologna, revelando o relacionamento entre  cultura e agricultura.
 
Dez anos depois de ter realizado  Mondovino sobre os bastidores da  produção de vinho  – na verdade,  uma análise crítica à globalização e à colonização cultural posta em prática pelo poder de grandes corporações – Nossiter volta ao tema e mostra o que isso significa.
 
Percorrendo várias viniculturas, ele traz uma série de experiências e argumentos para sua tese.  O que parece um paraíso bucólico, onde pessoas produzem vinhos de acordo com métodos artesanais, é na verdade revelado como sendo uma verdadeira batalha da luta desses pequenos produtores pela sobrevivência no mercado. 
 
A Associação de Denominazione di Origine Controllata (DOC), que seria  supostamente encarregada de olhar o interesse dos produtores independentes, promovem  apenas aqueles que seguem o viés da qualidade globalizada exigida pelos poderosos que dominam a fabricação da bebida; e a indústria, com suas regulações autoritárias e monopolistas, excluem métodos tradicionais de produção.
 
A única coisa que salva a paisagem dessas velhas viniculturas de serem totalmente destruídas é a afluência de estrangeiros utilizando suas estruturas como casas de férias de verão.
 
Com a ajuda de um amigo curador de filmes que disponibilizou tesouros de seus arquivos, Nossiter compara a restauração da herança cinemática com a cultura do vinho e revela surpreendentes conexões entre alimento para o corpo e alimento para a alma.  
 
A abordagem de Nossiter neste filme, como também em Mondovino,  remete a outro ótimo documentário,  As Horas do Douro, do diretor português António Barreto, que tem uma poética definição para o tema do seu filme: 
 
“ Um copo de vinho é uma arca de tempo. Um concentrado de séculos de evolução, de lutas sociais, de política, de cultura e de tecnologia. O que passa por ser um “produto natural” é o resultado de um longo processo de amadurecimento. E de um enorme esforço humano”.