OS SILÊNCIOS NO CINEMA DE CEYLAN
     
 

Carlos Augusto Brandão

PUBLICADA EM 06.03.14


Quando foi mostrado no Festival de Nova York, Era uma Vez em Anatólia, do diretor turco Nuri Bilge Ceylan – que agora chega ao circuito brasileiro –  impactou a plateia na sessão prévia para a imprensa da 49ª edição do evento. 
 
Passado nas secas e amplas planícies da Anatólia, entre as montanhas vulcânicas da Ásia Menor, a história traz um perfeito retrato da Turquia profunda.
 
Baseado em um fato real e com influências dramatúrgicas de Tchekov, o filme – que ganhou o Grande Prêmio do Júri em Cannes –  narra a investigação sobre o aparecimento de um corpo numa cidade da Turquia. O cadáver pode estar relacionado a um crime, mas nada é muito claro para as duas figuras de autoridade que acompanham a polícia: um médico e um promotor.
 
Trata-se de uma trama psicológica que se passa em boa parte de noite e que consegue, de forma lenta e pousada, ir ao mais profundo da alma e psique humana.
 
Como faz normalmente, Ceylan recorreu a atores não profissionais. Muhammet Uzuner vive a sua primeira experiência no cinema no papel do médico. O diretor se cercou igualmente de pessoas próximas para a concepção do filme. Sua mulher, Ebru Ceylan, colaborou no argumento, tal como fez em 2006, quando ele realizou Climas.
 
Numa seção paralela programada pelo festival denominada Fórum – destinada a um Q&A com os diretores –  Ceylan falou, na ocasião, sobre o filme e a estética narrativa de sua obra. Leis os principais trechos:
 
Como caracterizaria os personagens?
 
Acho e quero mostrar que ninguém é inteiramente bom ou mau. Quando crio um personagem desejo respeitar esse equilíbrio. Deve-se poder dizer sempre que um personagem somos nós mesmos, nunca o outro. 
 
Muito já se falou sobre o seu método de trabalho. Como o definiria?
 
Não é uma escolha racional, isso vem naturalmente, pois faço tudo por instinto. Não faço corte técnico, mas é verdade que gosto muito dos planos vastos. A imensidade do quadro permite pensar no lugar que ocupamos na terra.
 
O Senhor sempre acumula a direção com o trabalho de fotografia. Como foi o processo nas cenas noturnas?
 
Para poder ambientar o filme naquele universo, filmamos as sequências noturnas usando como iluminação apenas a lua. Quando a luz da lua não era suficiente e poderia prejudicar o trabalho de fotografia, colocamos algumas luzes em um balão e as utilizamos como iluminação suplementar.
 
Por que prefere trabalhar com atores não profissionais?
 
Uma das razões é que me sinto muito à vontade com eles. Um amador procura utilizar as suas experiências, suas próprias palavras, e isso por vezes é muito melhor, porque é mais ligado à vida, tem mais verdade. Um profissional se baseia, sobretudo, na técnica e nos seus papéis anteriores. Prefiro filmar seres humanos a atores. 
 
Concorda que a  incomunicabilidade é um ponto chave nos seus filmes?
 
Eu sou uma pessoa muito ligada na maneira como os seres humanos interagem e acho que algumas vezes captamos mais informação quando as pessoas optam por calar e se expressam através do olhar e dos sentimentos.
 
Como tem sido dito, o Senhor concorda que seu trabalho traz influências de Antonioni?
 
Quando era criança, assistia principalmente a filmes turcos de ficção científica, melodramas, faroestes. Somente mais tarde, passei a ter contato com trabalhos, não só de Antonioni, mas também de Bergman, Ozu e outros, que me despertaram o desejo de dirigir e certamente influenciam meu trabalho.
 

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